Musicalização na infância: aprendizagens por meio da mediação cultural - III Simpósio Acadêmico de Flauta Doce da Embap/UNESPAR
Mirtes Antunes Locatelli Strapazzon (UNIVILLE/SC)
Silvia Sell Duarte Pillotto (UNIVILLE/SC)
RESUMO: O artigo tem como objetivo refletir sobre a musicalização na infância (crianças de 4 /5 anos) e seus processos de aprendizagem por meio da mediação cultural, tendo como base ações de sensibilização. O espaço escolhido para a realização da pesquisa foi uma instituição pública de educação infantil e um museu de arte. Três atividades, constituídas como aprendizagem fizeram parte da pesquisa: contato das crianças com os instrumentos musicais, permitindo-lhes identificar os instrumentos, entre eles, a flauta doce. Foi possível para as crianças, além da identificação dos instrumentos, perceber também sonoridades, conectando-as com outros sons, da natureza, por exemplo. Na sequência, as crianças tocaram flautas, observando variáveis sonoras, utilizando o sopro com maior ou menor intensidade, tocando os instrumentos de percussão com vários movimentos. Outra atividade foi a escuta dos sons pelas crianças. Nesse momento, as crianças perceberam a construção de outras sonoridades, na maioria, desconhecidas por elas. Por fim, ocorreu a atividade sobre criação musical. As pesquisadoras tocaram ao som da flauta várias músicas enquanto as crianças acompanharam cantando, emitindo sons vocais e batendo palmas. Com a abordagem qualitativa e viés na cartografia, a primeira etapa da pesquisa finalizou com expectativas atendidas, especialmente em tratar a mediação cultural como experiência de sentidos nas relações entre envolvidos, instrumentos musicais e espaços. A musicalização se fez presente nos espaços formal e não formal da educação.
PALAVRAS-CHAVE: Musicalização. Mediação cultural. Espaço não formal. Aprendizagem.
Esse artigo é um recorte da pesquisa que está em andamento num Programa de Pós-Graduação - Mestrado em Educação e destaca a musicalização em processo de mediação cultural como possibilidade de aprendizagem na infância, utilizando a flauta doce como instrumento musicalizador/condutor nas práticas de sensibilização. Nesse contexto, nossas escolhas têm sido atreladas por temas como: criança/infância, mediação cultural, aprendizagem e musicalização.
Como a discussão dessa escrita é percorrer o conceito de musicalização, buscamos nos princípios de Penna (1990) subsídios teórico-metodológicos. Para a autora, a musicalização mobiliza reflexões para além da abstração da música. Essa proposta visa repensar a musicalização numa vertente sociológica e educacional para fundamentar a prática. Dessa forma, podemos definir musicalização como: “[...] ato ou processo de musicalizar. Musicalizar (-se): tornar (-se) sensível à música, de modo que, internamente, a pessoa reaja, mova-se com ela” (PENNA, 1990, p. 19).
Assim, num amanhecer não tão ensolarado, esperamos as crianças no museu casa. Esse museu casa é um espaço extraordinário... Era a casa do artista, a qual foi apropriada pelo setor público como museu, onde estão obras, objetos e indumentárias do referido artista. Nesse museu casa tem um espaço destinado a exposições de outros artistas locais, bem como experiências com arte/educação. Além disso, é um espaço aberto rodeado por uma floresta, muita grama, bancos para se sentar e apreciar a natureza. Localizado num morro de preservação ambiental, o espaço é propício para mediação ao ar livre também.
O esperado naquela manhã é que não chovesse para que pudéssemos aproveitar tudo! Chegamos cedo, colocamos as fotos/imagens no espaço reservados aos artistas locais, penduradas em bambolês para que pudéssemos lembrar o mesmo movimento da mostra que fora realizada na unidade de educação infantil dias atrás. Ao lado desse espaço havia algumas toras de madeira e nossa imaginação voou! Os instrumentos foram colocados nessas madeiras para que as crianças tivessem a liberdade de tocá-los sem interferência dos mediadores.
A música estava literalmente no ar! O contágio tão foi grande que até os adultos pegaram os instrumentos que restaram ali e tocaram também. Os sinos foram a paixão das crianças. Umas diziam “Olha a música do natal”, outras falavam “tem outro som”. As professoras, os mediadores do museu e as demais pesquisadoras pararam para escutar e ouvir a música, pois existia ali uma melodia sim, junto com harmonia e ritmo realizada naquele momento, naquela experiência por crianças de 4 e 5 anos de idade, sem terem tido aulas de música anteriormente.
Após a experiência de tocar, cantarolar e ouvir os interlúdios de uma história, as crianças foram buscando no som da flauta doce o outro espaço do museu, ali onde estavam as obras do artista, ao vivo e em cores. As crianças colocaram os instrumentos no baú na entrada do museu casa, observando as obras do artista. Passaram um bom tempo perguntando: “ele morreu?” “É a mãe dele que está com ele no colo? É a mesma foto que a gente viu antes?” Aos poucos, mais do que responder fomos adentrando no universo da criança, construindo diálogos lúdicos mobilizando o pensamento infantil.
Professoras, pesquisadoras e mediadores do museu casa estavam atentos e aos poucos foram concluindo essa etapa e ao sair... outros sons, cantos e um quarteto de flautas doces tocando. As crianças ouviram as músicas que já haviam sido tocadas e cantadas na unidade de educação infantil numa mediação anterior a do museu, reconhecendo-as ao mesmo tempo em que escutavam os amigos/flautistas tocando. Nesse momento, é difícil descrever em palavras o olhar das crianças quanto mais a sua escuta sensível. O som musical levou as crianças a cantarem, a sentirem novamente o desejo de se movimentar com palmas e com o corpo. Assim, foram em busca dos instrumentos que estavam alojados no baú... Tocaram percussão ao ritmo das melodias enquanto o quarteto ainda tocava.
Depois dessa vivência, o quarteto de flautas doces conduziu as crianças para a varanda do museu casa, tocando canções infantis, algumas delas desconhecidas pelas crianças. Nenhuma delas queria parar de cantar juntamente com o quarteto! Após essa mediação organizamos uma para uma roda de conversa com as crianças, ou melhor, apresentando uma história com movimentos sonoros e corporais.
Na hora de ir embora, muitas crianças ainda queriam permanecer no museu e seus sentidos estavam alerta, mesmo depois de duas horas com ações de mediação cultural. Nesse contexto, a mediação cultural pelo viés cartográfico trouxe uma perspectiva para indicar novos caminhos em musicalização e expressões sonoras possíveis nos espaços formais e não formais da educação. Uma experiência para todos nós - crianças, professores, pesquisadores, amigos/flautistas, gestores e coordenadores.
A experiência da apresentação desse artigo se deu em Curitiba no Campus I da UNESPAR – Universidade Estadual do Paraná. Uma experiência solitária, quando o significado de pesquisa integrada está consolidado. Digo isso, porque no NUPAE – Núcleo de Pesquisa em Arte na Educação da UNIVILLE – Universidade da Região de Joinville, o qual eu pertenço, tem uma dinâmica de integrar seus membros em pesquisas qualitativas pelo viés da sensibilidade e do método da cartografia, onde os trios, as duplas ou mais pesquisadores trabalham em conjunto seja em campo seja no momento de compartilhar e escrever.
A solidão da qual eu falo está nesse aspecto retratada, embora essa pesquisa esteja repleta de mãos tanto no elaborar e apresentar roteiros, confeccionar materiais, realizar as mediações, fazer produções de mídia, quanto escrever; foi a primeira vez que apresentei a pesquisa sozinha num evento acadêmico.
Assim, dias depois, retomando as atividades do NUPAE e o compartilhamento dessa experiência com os demais pesquisadores ficou o registro de quanto é importante um grupo consolidado e apoiador. E mais, o quanto é prazeroso trabalhar e pesquisar integrado ao coletivo.
Profª. Anete
Weichselbaum (Curitiba/PR) e Mirtes Strapazzon (Joinville/SC). Foto da autora
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Texto disponível: Anais p. 49-60
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